Dona Lucilene e Cajueiro seguem resistindo
Em Cajueiro, território sagrado, reside Dona Lucilene Costa, artesã, que desde muito cedo despertou para feitura de trabalhos manuais, com matéria-prima extraída da natureza e que ela própria recicla.
Lucilene tem uma forte história de luta no enfrentamento à invasão e ao assédio dos representantes de uma empresa portuária de proporção internacional no “quintal de casa” que tem afetado sua rotina, sua produção e sua vivência naquele espaço.
Mesmo com episódios de desesperança, ao ver muitos vizinhos e parentes venderem e serem expulsos de suas casas, Dona Lucilene decidiu permanecer e lutar, defendendo o vínculo direto que tem com Cajueiro há mais de 30 anos.
Não só ela, como sua mãe e irmã ainda moram na região, depois de terem deixado o bairro Anjo da Guarda há muitos anos, em uma história de mudanças em busca de um lugar que pudesse dar continuidade ao seu bem-viver. E foi em Cajueiro que sua família se estabeleceu, por fim.
Raiz do Cajueiro
A relação de Lucilene com o local, no entanto, é bem mais antiga. Vem da infância, quando ela visitava seu avô que já morava ali, na região da praia de Cajueiro, período em que a mata nativa era predominante e havia poucas casas de moradores, sem acesso à eletricidade ou água encanada. Moradores que viviam exclusivamente dos frutos da terra e do mar.
Por esses e outros motivos, Dona Lucilene mantém uma conexão de amor e respeito profundo por esse território. Ela, juntamente com alguns moradores são considerados “Raízes do Cajueiro”.
Lucilene é uma mulher doce, afetuosa e uma fortaleza ao mesmo tempo, que ao longo deste período, após tantas violações cometidas ao corpo-terra, fez com que ela expressasse sua dor e angústia através de palavras escritas em forma de poemas e textos.
Escrevivências que retratam a luta que ela vivencia a partir da insubmissão de uma realidade que querem impor. A verbalidade das palavras que utiliza em seus textos, retrata indignação, dor, revolta, mas também sentimentos, esperanças e o cuidado que devemos ter com a Mãe-terra.
Dona Lucilene, ainda em seus textos, agradece por todas as pessoas que se somam na luta de Cajueiro, pessoas que assim como ela, carregam a teimosia e o sonho de dias melhores para este lugar.
Relação com a terra
Com uma população majoritariamente negra, a atividade predominante na comunidade é a pesca de mariscos e frutos do mar, como camarão e siri, prática que atravessa gerações, visto que Cajueiro tem o privilégio de ser banhada pelo mar.
Além disso, as mulheres da comunidade também produzem alimentos derivados do que se extrai da terra, como geleias, doces; e das palmeiras de babaçu que ainda resistem no local, fazem azeite, biscoitos e fubá de coco, que são comercializados em feiras agroecológicas de São Luís.
Dona Lucilene também cultiva frutas, além de plantas ornamentais e hortaliças, em toda a sua casa predomina o verde e o cuidado que a mesma tem com natureza, mas alega que todo esse verde do qual cuida e que deixa ser cuidada, também tem sido reduzido com a presença da empresa, pela poluição proveniente da destruição que está trazendo a construção do porto.
Ela pondera ainda sobre como a convivência com a empresa portuária afeta a comunidade e poderá causar danos maiores, uma vez que mudanças estruturais podem ser realizadas para facilitar o acesso ao porto e modificar a paisagem e os costumes locais.
A continuidade da construção do porto pode implicar em asfaltamento, que vai aumentar o trânsito de máquinas e carros, poluição sonora, do ar, desmatamento, o fluxo maior de pessoas que podem transformar a comunidade reconhecidamente tradicional, com o vazio discurso de progresso, anulando histórias, a tradição e a relação com o local que os moradores têm.